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Nós nunca seremos o casal do comercial da Coca-Cola

logo seremos dois estranhos. Mudaremos de número, e de endereço, as feições em relação ao outro será de rancor, e logo indiferente. Apagarei seus filmes favoritos e suas músicas do meu lap top, e eu serei mais um decalque no seu. Vamos envelhecer e talvez nossos filhos se conheçam. E se amem como nós, mais que a nós. Ou talvez você se mude para frente da minha casa. Não andarei segurando os bolsos de trás de suas calças mais. E você não vai poder implicar com o meu short. Nem poderei andar agarrada ao seu braço quando passarmos em frente a um beco, escuro e assustador. Tropeçarei sozinha em meus suspiros quando a ficha cair, e eu saber que você seguiu em frente mesmo, que aquela menina na sua foto do instagram não é sua prima, nem a sua irmã perdida, vou chorar em silêncio quando cogitar a possibilidade dela ser sua namorada, mas vai passar. Vou procurar meu equilíbrio mental perto das paredes agarrada a uma garrafa de vodca. Esquecerei suas manias, suas vontades, seus sonhos, os seus segredos de família. Riscarei o seu nome do meu caderno escolar. E mudarei o nosso trajeto do mapa, para meu. Reatei a amizade com aquele meu amigo, que você insistia em ter ciúmes, dizendo que ele dava em cima de mim, você tinha razão. Passarei em branco pelos aniversários do dia em que dissemos sim um para o outro. Meus dias serão mais longos sem seus braços ao redor de mim, me contando aquelas inúmeras histórias sobre os seus avós. Não acharei minha esperança nas minhas gavetas com suas meias pedidas. Vou odiar para sempre o seu conformismo. Perderei o tempo lembrando da sua risada. Mas passarei mais tempo esquecendo. Não perceberei seu cabelo grande, sua barba por fazer, sua camisa nova. Talvez eu o cumprimente com as sobrancelhas e não terei estômago para dizer coisa alguma. Não olharei para trás, para não prometer uma volta. Não olharei para os lados, para não abençoa-lo com a dúvida. Sentirei a sensação de residir numa cidade extinta. Não brigaremos no supermercado, nem assistindo futebol, nem pelo controle remoto, nem vou te emprestar meus livros favoritos. Não puxarei assunto com sua mãe na fila do pão. Não receberemos elogios de estranhos dizendo que nós combinamos. Não tocaremos os pés de madrugada. Não tocaremos os braços no cinema. Não trocaremos de lado ao acordar. Não dividiremos o jornal. Não olharemos as vitrines em busca de presentes. Nunca descobriremos ao certo o que nos impediu, quem desistiu primeiro, quem não teve paciência de compreender. Só os ossos têm paciência, meu bem, não a carne, com ânsias de se completar. Não encontrará vestígios de mim no futuro. Abandonará de repente meu telefone. Na primeira recaída, procurará o número na agenda. Não estava em sua agenda. Não se anota amores na agenda. Na segunda recaída, perguntará o que faço aos conhecidos. Na terceira recaída vai passar em frente à onde eu trabalhava, e me verá no café rindo com algum colega, conhecido, ou novo amor. As demais recaídas serão como soluços depois de tomar muita água. Terá filhos com outras mulheres. Terá insônia com outros amores. Desviará de assunto ao escutar meu nome. E vai mudar de canal, quando sua mente reproduzir a gente naquele comercial clichê da Coca-Cola. 

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