Nós nos conhecemos aos 13 anos de idade, aos 17 ele entrou para a minha turma de inglês, e aos 18 conversamos pela primeira vez. Ele foi meu amigo nas noites de tristeza, e meu abrigo nas noite de solidão. Me pediu em namoro em uma quinta feira chuvosa de abril, e terminamos no estacionamento de um shopping. Ele pensava em casar. Pensava em filhos, e um emprego decente e um quintal enorme e muitos cachorros. Eu dizia que seria escritora, e que um dia escreveria sobre ele naquelas colunas que falam sobre amor. Eu pensava em Nova York. E Londres. E no pier da Califórnia. Pensava numa vida longe da tranquilidade que é o Brasil. Filhos? Hahahah. Queria escrever e morar num apartamento horrível e com as paredes descascadas, e viver uma paixão desajustada e aprender a fumar e encerrar minhas noites com um martini belvedere me perguntando o que há de errado comigo. Eu tinha acabado de fazer 19 anos e ainda não queria algo tão fácil.
Em um domingo de Setembro, eu estava jogada no chão da minha sala. Naquele dia nós saimos e sentamos na carroceria do carro dele e comemos um big mac silenciosamente. Preferimos isso a sentar em um restaurante e olharmos um para o outro e darmos conta que o erro éramos nós. “O que houve?”, ele questionou eu permaneci em silêncio e completou. “Estranha...”, Fazendo eu me questionar porquê amava ele.
Ele me olhou como se o problema fosse eu, e eu fiquei me perguntando o que houve com aquele garoto engraçado, que fazia piadas sobre a professora de Química no final do terceiro ano. Eu, do meu jeito torto, estranho, o amava. E chorando, muitas vezes prometi que o amava, e que sempre o amaria. Mas nós fomos parando de nos entender, estávamos sempre errados, depois de um ano e uns quebrados ele me olhou nos olhos no estacionamento do Shopping, e jurou que não dava mais, porque os risos deram lugar às brigas, nossos problemas se tornaram dramas, nosso amor se tornou insegurança, que se tornou paranoia. Eu disse que o amava, e eu acreditei nisso por mais tempo do que deveria.
Três meses depois lá estava eu, vendo ele seguindo em frente, e não sabia como fazer o mesmo, eu vi ele se apaixonar novamente, e abraçar pessoas vazias, passei a ficar mais tempo querendo saber dele, do que de mim. Vi ele seguir em frente, e transformar nosso amor épico, em uma briga de bar. Saber se ele estava bem, foi minha justificativa para cinco meses depois, ainda me pegar abrindo nossas conversas antigas, e querer saber dele. Eu me prometi que só queria saber se ele estava bem. Mas não era isso. Eu me convenci que só queria saber se ele tinha conseguido concretizar aqueles planos. Mas eu queria saber se ele ainda escutava a mesma música que ouvíamos juntos. Queria saber se ele conseguiu se formar na faculdade, ou se ele desistiu daquela idéia de se mudar para SP. Eu olhava para a foto dele com uma nova garota, tentava não me lembrar de como eu me sentia quando ele me segurava pela cintura. Pensava que talvez eles fossem só amigos. Ou talvez essa fosse a prima dele. Ou irmã desaparecida. Mas não era.
Eu não tinha o direito de me importar com isso. Mas eu me importei. Eu não tinha o direito de fingir que ainda conhecia ele. Quando eu vi a foto dele com a ex namorada do meu melhor amigo, eu fechei o laptop, e chorei, chorei muito, porquê ele estava seguindo em frente, e eu estava ali, abraçada ao passado, agarrada ao meu único fio de esperança. Já tinha me torturado o suficiente. Mas assim que eu dormi, sonhei com ele. Sonhei que estávamos bem de novo, e ele me empurrava no balanço da praça 22 de agosto.
Era verão no início de 2016, e nesse dia choveu muito. Eu estava esperando a minha mãe fazer compras, e fiquei esperando ela, no estacionamento. Estava chovendo e eu estava encostada no carro e eu sentia que estava congelando. E lá estava ele do outro lado do estacionamento. Ele deixou a barba por fazer, o cabelo estava mais curto, nos olhamos por longos 20 segundos, eu idealizei esse reencontro tantas vezes, que perdi às contas de quantas vezes enfeitei aquele momento. Mas nesse dia, eu estava descabelada pela chuva, e ainda tinha molho de tomate na minha blusa branca. Queria tanto, correr pra ele, contar todas as coisas que tenho passado, quase deixei um riso se formar no meu rosto, mas lembrei que não posso. Dei as costas entrei no carro e fiquei ali, deixando que a chuva disfarçasse o choro.
Naquele dia eu fui pra casa, e terminei a noite assistindo algum seriado. E dormi, agarrada à uma foto no meu celular.
Dormi e novamente sonhei com ele. Desta vez minha mente reproduziu o episódio na carroceria do carro dele, dormiamos ali, apenas isso, seu abraço me acolhia. O momento depois de acordar foi o pior de todos. Eu senti que estava dormindo no braço dele, o sonho foi tão real, que eu senti que a gente nunca tivesse terminado. Eu acordei e dei de cara com a realidade. Lembrei o quão fácil era amar e ser amada, lembrei que o amor era recíproco, mas o orgulho também era, assim como o egoísmo.
Eu peguei meu celular e dei uma olhada no instagram, precisava preencher minha mente com alguma coisa que não ele. Mas a cada vez, sentia uma necessidade de saber dele, eu imaginava ele brigando com sua nova namorada pelo controle da TV e sorria pensando nisso, e lamentava por ela ser tão sortuda. Dois meses depois de encontrá-lo no estacionamento, outra foto surgiu: ele e a garota do corpo em forma de ampulheta no boliche. Senti um nó no estômago quando entendi que ela era alguém presente na vida dele. Olhei aquela foto e me perguntei se ela gostava de esportes, se assistia futebol com ele, aos domingos, e o zuava quando flamengo perdia. Ou só estava lá pela cerveja. Ou se ela só estava se esforçando pra ele acha-la legal. Ou se eles estavam mesmo se divertindo. Vi eles juntos, aparentemente felizes, ainda assim não aceitava que ele tinha superado. Esperava para talvez em alguns anos – eu sempre lembrava daquela promessas que eu nunca saberei se eram reais, ou fruto de uma imaginação fértil. Eu não conseguia aceitar que ele estava se apaixonando por outra enquanto eu ainda o amava. Naquela época, eu não entendia que o amor podia ser algo tão platônico e triste. Eu chorava na minha cama quando pensava que ele podia falar para ela coisas que tinha falado para mim, ou que olhava para ela da mesma forma que olhava para mim. Estava tão triste que sentia dó dela. Talvez eu fosse o amor épico dele, e ela só uma página. Pensei que para homens é mais facil seguir em frente. Fantasiar a verdade sempre foi meu dom.
Eu pensava nele deitado na carroceria do carro, olhando para o céu, desejando que aquela garota fosse eu. Era mais fácil imaginar que ele também pensava em mim, do que aceitar que o fato de que ele não me procurou: porque ele não me amava mais.
Olhava para a foto do perfil dela e depois para a do meu, e pedia pra minha melhor amiga comparar nós duas. Ela era loira também, tinha o sorriso grande. Olhava para nossos perfis e via tudo que a gente tinha em comum, e tudo que a gente não tinha. O rosto dela é mais ânguloso, e ela tinha sardas, meu cabelo é mais loiro e minha pele mais clara. Meu sorriso não é tão grande. Ela parecia sair mais pra baladas, e aparentemente não tinha cachorros e não gostava de séries. Ela parecia passar horas se arrumando, e eu penteava o cabelo quando dava. Ela gostava de sertanejo universitário, e eu Rock alternativo. A gente tinha muitas diferenças, mas também algumas familiaridades óbvias: amávamos nossas famílias, nossos amigos, algumas músicas, os animais e o mesmo cara.
Foram meses assistindo eles se marcarem em fotos em família até a mudança de apartamento de estações e status no facebook. Eu sofria vendo a sua familia especulando um possível casamento nos comentários. Retuitava umas indiretas, e percebi quando ela ficou amiga da sogra. Fui a espectadora da viagem para Porto Seguro deles, enquanto ele usava um cordão do AC/CD que foi presente meu. Vi ela dirigindo o carro dele, o mesmo carro em que nos beijávamos. O mesmo carro que nos amamos, o mesmo carro que terminamos.
Eu vi o relacionamento deles chegar a fases que o nosso não tinha.
Eu me perguntava se eles brigavam. Me perguntava se brigar pelo controle da TV era algo bonitinho, ou também a irritava. Me perguntava se ela também queria o quintal grande, e cachorros, e três filhos, e mais um casal de gêmeos ou sonhava alto como eu.
Eu falei tanto nele que esqueci de mencionar a lista de pessoas que eu conheci e nenhuma delas boa o suficiente pra me fazer não querer saber dele.
Eu queria saber o que ia acontecer com eles. Se eles iam ficar juntos. Ou, talvez o namoro caisse na rotina. A única coisa que eles não combinavam, era o signo. Planejava até o vestido que eu usaria no dia que eu invadiria o casamento deles, e diria: Você não pode casar com ela, ela não é o amor da sua vida, eu sou. como Naomi e o Max em 90210.
Apesar de tudo, nunca falei com ele.
Eu ainda queria ser escritora, sonhava em ir pra Nova York morar com o meu pai. E Londres com minha avó. E talvez na Califórnia sozinha. Nada tinha mudado. Eu gostava do olho que ele fazia quando não estava pronto para a foto, aquele quase sorriso tímido. Ele me lembrava de como era me apaixonar, olhava para o número dele, com a mesma malícia que uma criança olha para a campainha de uma casa qualquer, tinha vontade de puxar algum assunto e sair correndo. Era tão bom ter ele ali, tão perto mesmo que ele não estivesse. Eu não me achava obsecada como a Bess no filme Crush, mas talvez eu fosse. Assistir a vida feliz de alguém, não é saudável. Mas foi uma forma que encontrei de sentir que ele ainda era meu.
Alguns meses depois com o passar do tempo, parei de me perguntar sobre ele. E quando ele publicava alguma foto com ela, não doía mais tanto. Até que vi o relacionamento deles chegar a um fim. E novamente vi ele seguir em frente de novo. Mas desta vez ele se tornou um incômodo familiar como um corte cicatrizado, que quando você aperta, ainda dói. Passava mais tempo sem querer saber dele. Às vezes me pergunto como ele está, mas logo começo à pensar na tarefa de alemão pendente. Eu não conheço mais ele. Ver ele seguindo em frente, me faz pensar como fui capaz de amar e que sou digna de ser amada também. E percebi que quando você ama alguém, mesmo, ama pra caralho, você também desiste, porquê quando não existe reciprocidade não existe amor .